31 de outubro de 2011

A falta que ama

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Entre areia, sol e grama
o que se esquiva se dá,
enquanto a falta que ama
procura alguém que não há.

Está coberto de terra,
forrado de esquecimento.
Onde a vista mais se aferra,
a dália é toda cimento.

A transparência da hora
corrói ângulos obscuros:
cantiga que não implora
nem ri, patinando muros.

Já nem se escuta a poeira
que o gesto espalha no chão.
A vida conta-se, inteira,
em letras de conclusão.

Por que é que revoa à toa
o pensamento, na luz?
E por que nunca se escoa
o tempo, chaga sem pus?

O inseto petrificado
na concha ardente do dia
une o tédio do passado
a uma futura energia.

No solo vira semente?
Vai tudo recomeçar?
É a falta ou ele que sente
o sonho do verbo amar?





Carlos Drummond de Andrade

29 de outubro de 2011

O Livro do Desassossego

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“A vida é para nós o que concebemos nela. Para o rústico cujo campo próprio lhe é tudo, esse campo é um império. Para o César cujo império lhe ainda é pouco, esse império é um campo. O pobre possui um império; o grande possui um campo. Na verdade, não possuímos mais que as nossas próprias sensações; nelas, pois, que não no que elas vêem, temos que fundamentar a realidade da nossa vida.
Isto não vem a propósito de nada.
Tenho sonhado muito. Estou cansado de ter sonhado, porém não cansado de sonhar. De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos. Em sonhos consegui tudo. Também tenho despertado, mas que importa? Quantos Césares fui! E os gloriosos, que mesquinhos! César, salvo da morte pela generosidade de um pirata, manda crucificar esse pirata logo que, procurando-o bem, o consegue prender. Napoleão, fazendo seu testamento em Santa Helena, deixa um legado a um facínora que tentara assinar a Wellington. Ó grandezas iguais à da alma da vizinha vesga! Ó grandes homens da cozinheira de outro mundo! Quantos Césares fui, e sonho todavia ser.
Quantos Césares fui, mas não dos reais. Fui verdadeiramente imperial enquanto sonhei, e por isso nunca fui nada. Os meus exércitos foram derrotados, mas a derrota foi fofa, e ninguém morreu. Não perdi bandeiras. Não sonhei até ao ponto do exército, onde elas aparecessem ao meu olhar em cujo sonho há esquina. Quantos Césares fui, aqui mesmo, na Rua dos Douradores. E os Césares que fui vivem ainda na minha imaginação; mas os Césares que foram estão mortos, e a Rua dos Douradores, isto é, a Realidade, não os pode conhecer.
Atiro com a caixa de fósforos, que está vazia, para o abismo que a rua é para além do parapeito da minha janela alta sem sacada. Ergo-me na cadeira e escuto. Nitidamente, como se significasse qualquer coisa, a caixa de fósforos vazia soa na rua que se me declara deserta. Não há mais som nenhum, salvo os da cidade inteira. Sim, os da cidade dum domingo inteiro – tantos, sem se entenderem, e todos certos.
Quão pouco, no mundo real, forma o suporte das melhores meditações. O ter chegado tarde para almoçar, o terem-se acabado os fósforos, o ter eu atirado, individualmente, a caixa para a rua, mal disposto por ter comido fora de horas, ser domingo a promessa aérea de um poente mau, o não ser ninguém no mundo, e toda a metafísica.
Mas quantos Césares fui!”

Fernando Pessoa

28 de outubro de 2011

A ausência cura o amor*

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Hoje passei pela 3ª travessa da saudade,
Na boca o gosto amargo do café e na lembrança as fantasias de um carnaval passado por aquelas ruas vazias.
Tava tudo meio doído e, de repente, aquele amor todo se esvaiu pela janela do ônibus... 
Realmente você não era tão necessário assim para que meu sorriso fosse feliz. Que mania a minha de submeter o meu sorriso ao olhar alheio.
Com o tempo, as dores vão se aquietando e todas as lágrimas, por mais salgadas e belas, foram deixando o drama mexicano e se acomodando na melodia dos fones de ouvido.
Preciso de antibióticos para curar as infecções que carrego na minha alma.
Uma dose de amoxilina para minha garganta super dolorida pelos vômitos da saudade.
Uma caixa de rivotril para acalmar as pressões dos nervos(ismos) alheios.
Um paliativo qualquer, um floral que sirva, qualquer homeopatia recomendável.
Se nada servi um vinho por favor, do mais doce e barato, para que todo o tormento se embriague, a memória se apague e novas coisas aconteçam.
Hoje passei pela 3ª Travessa da saudade e ela fica ao lado do Cemitério.
Se hoje sinto saudades?
Sim, sinto todos os dias.
Saudade do perfume de jasmim que tinha a minha rua.
Saudade do tempo em que nada (definitivamente) era tão sério e definitivo.
Saudades das brigas de 5 segundos com meu irmão. Antes jogávamos brinquedos um no outro, hoje lançamos ofensas.
Saudade do abraço materno que me protegia, dos cuidados com a boneca da casa e de toda a inocência dos olhares lançados nas atitudes.
Saudades de acordar de bom humor e abraçar vó e tia.
Saudades de saber que tudo está bem e não precisa se preocupar.
Hoje passei pela 3ª Travessa da saudade e por ela passam todos aqueles que deixaram as saudades mais bonitas, aquelas que já não podem ser mais corrompidas e que guardamos em casa nos porta-retratos.





Put me back in the bottle
Where the sea meets the sun
Where the bones and their rattle
It don't mean anything to no one
And I, I had a swing
When my soul was my own
I had my teeth bared for battle

* Marcel Proust

26 de outubro de 2011

2ª Lição

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Como fazer para que os cheiros de nossos detalhes se entranhem em nossas almas?
Se esconder na noite, se emaranhar em cabelos, mãos, dedos e desejos...
Sentir em teus braços o pecado da língua na pele...
Sentir em minha boca o pecado dos olhos e dos sussurros...
O pecado, Meu Bem, de me lançar em tua cama e lá sentir as delícias de tua carne.
Carne feita de gozos e risos
(...)


Beijo nos olhos… 
Na alma…
Na carne...

17 de outubro de 2011

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"Fisicamente, habitamos um espaço, 
mas, sentimentalmente, somos habitados 
por uma memória."

José Saramago

14 de outubro de 2011

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"Porque não conseguia dormir nem comer, à espera dele. 
Portinari e Flor...
Agora, agora vou ser feliz, pensava o tempo todo numa certeza histérica. Até que aquele cheiro de alecrim bergamota, de hortelã madeira fresca, começasse a ficar mais forte, para então, um dia, escorregar que nem brisa por baixo da porta e se instalar devagarinho no corredor de entrada, no sofá da sala, no banheiro, na minha cama. 
Ele tinha chegado."

Caio Fernando Abreu

12 de outubro de 2011

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" Foi muito lindo te ver pela primeira vez e pensar,
sem palavras: eu quero"

#CaioFernandoAbreu

10 de outubro de 2011

1ª Lição

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De todos esses olhos que passeiam nas possibilidades,
Teus olhos, como um carinho de amêndoas, passearam pelos meus.
Calma coração, os beijos que recebeste ainda foram tão singelos,
Há, nesse sorriso meigo, demônios que pulsam por vorazes desejos.
Beijos que precisam de continuação
(...)

8 de outubro de 2011

Tiny Vessels

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(...)

Tiny vessels oozed into your neck
And formed the bruises
That you said you didn't want to fade
But they did and so did i that day
(...)


 Death Cab For Cutie

5 de outubro de 2011

#Fica Dica 9

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Exitem 3 tipo de homens: os bonitos, os charmosos e os inteligentes...
Você se enquadra nos bonitos,
Mas ando dispensando certas belezas.
Charme e inteligência são cada vez mais essenciais.